Primeira Igreja Presbiteriana Independente de Santos
Casa de oração para todos os povos
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Santos, 01 de janeiro de 2017. 

Seja bem-vindo, 2017 

O ano que passou foi um período muito difícil para o povo brasileiro sob diversos aspectos. Tivemos o impeachment da presidente Dilma Rousseff e toda a agitação política e econômica tanto nos atos que levaram a esse evento como naqueles que foram consequências dele. E o impeachment em si não evitou que, a cada dia quenos levantamos vejamos um novo escândalo estampado nas páginas dos jornais. Mesmo uma festa que tinha tudo para ser memorável, como as primeiras Olimpíadas em um país da América do Sul, teve a sua beleza e sua alegria turbadas pelo ambiente de incerteza e pelas denúncias de corrupção que a envolveram. O pior de tudo, concordam muitos analistas, é que o resultado de tal crise é uma divisão nunca vista antes no povo brasileiro

Um ano tão triste, marcado ainda pelo desastre aéreo que vitimou todo um time de futebol, não poderia terminar de forma mais trágica do que um vendedor de doces ser espancado até a morte simplesmente por defender um travesti da fúria tão irracional quanto injustificada de dois homens frustrados.  

Esse ano que passou foi um ano que gostaríamos de esquecer. Se pudéssemos, o apagaríamos dos registros da História. Mas não pode ser assim Acertadamente a Unesco mantém Auschwitz como patrimônio da humanidade, para que ninguém se esqueça do horror ali praticado. Da mesma forma, 2016 (como outros anos trágicos de nossa história)deve ser guardado na memória dos brasileiros para que aprendam com os erros que levaram a esta situação e corrijam seu caminho. 

E, por falar em corrigir, eis que chega 2017. E renova-se a esperança. Ninguém, em sã consciência é capaz de achar que a simples mudança no calendário pode transformar toda a triste realidade que ainda vivemos. E nem as pessoas e instituições nos dão qualquer chance de acreditar que tudo será diferente daqui para a frente. Muito pelo contrário. Mas nós, brasileiros teimamos em ter esperança, mesmo uma esperança que vai contra a corrente.

Nossa esperança existe porque não está baseada em pessoas ou instituições, pois quando se coloca em tais a expectativa, o resultado, invariavelmente, é a frustração. Não adianta acreditar nesta ou naquela pessoa ou instituição, por mais belo que o pacote possa parecer, pois que bonitas embalagens escondem péssimos produtos. Nossa esperança está naquele que pode transformar a realidade,o Senhor. 

Mesmo a esperança colocada no Senhor não pode ser motivo de resignação ou omissão. Não pode ser resignação porque Deus não quer que nos conformemos com as injustiças e aflições desse mundo. E não pode ser omissão porque ele nos chama a sermos participantes na transformação de nossa realidade. Ao povo que estava aflito no Egito ele não mandou aceitar a situação, nem tampouco desistir quando se viu entre o mar e o exército inimigo, mas ordenou a Moisés que o povo marchasse.Por isso o mar se abriu.

 

Que em 2017 o povo de Deus marche segundo a sua ordem, pois se assim o fizer,certamente o mar de injustiças e aflições se abrirá à nossa frente, dando lugar ao caminho de amor, paz e segurança. A nossa esperança não está em pessoas ou instituições, está no Senhor. No Deus que chama e capacita o seu povo para a ação transformadora da realidade, tanto da realidade pessoal de cada um como da realidade social de todos nós. Coloquemo-nos em marcha, pois o Senhor nos chama para tal

Domingo, 08 de janeiro de 2017. 

Deus manifesto. 

No dia 06 de janeiro é comemorada no calendário cristão a Epifania do Senhor. Epifania significa manifestação, apresentação, revelação. Essa data foi escolhida próxima ao Natal porque no nascimento de Jesus, Deus se manifestou à humanidade como nunca o havia feito antes e nunca o fez e nem o fará depois. Jesus é o ápice, o ponto alto da revelação do Pai ao ser humano. Conforme Hb.1,3, Jesus é a prefeita expressão do ser de Deus, única forma pela qual podemos ver o Senhor. 

O ser humano não pode, nesta vida, contemplar a Deus diretamente. Nossos olhos, nosso coração e nossa mente não são capazes de compreender a realidade divina em toda a sua expressão, glória e grandiosidade. Só o vemos, no dizer de Paulo, como que por espelho, ou seja, indiretamente. 

Jesus é,conforme o prólogo do Evangelho de João, a palavra de Deus que se fez carne,habitou entre nós e pela qual vimos a glória do Senhor. Tal afirmação é cheia de significados. A palavra de Deus é o modo como o Senhor age e transforma a realidade, inclusive a história humana. Dizer que Jesus á a palavra de Deus é afirmar que ele é a intervenção que transforma a nossa vida. É dizer que ele éa perfeita expressão do ser e do agir de Deus. 

Afirmar que ele habitou entre nós é uma preciosa afirmação de fé, não só uma constatação histórica. Não é só a constatação de que Jesus, o Nazareno, andou pelos caminhos da Galileia e foi morto crucificado pelos soldados de Pilatos em Jerusalém. É a declaração de fé de que o Jesus, nascido de Maria em Belém era o Filho de Deus entre nós, de que suas palavras são ensinos divinos e de que sua morte e ressurreição cumprem os desígnios de Deus para a salvação dos seres humanos. 

A manifestação da glória de Deus em Jesus pode ser interpretada a partir de diversos referenciais. Alguém pode entender que os milagres que ele fez significariam a irrupção do sobrenatural poder divino na natureza. Outros hão de pensar que a sabedoria de seus ensinos só poderia ter origem na inteligência que vem do Altíssimo. Há mesmo quem acredite que a glória de Deus se manifesta no ser divino de Jesus. Todos esses aspectos da pessoa de Jesus Cristo apontam para sua divindade, mas não é, a meu ver, a mais significativa manifestação da magnitude do Senhor. 

O que caracterizou Jesus como o enviado do Pai, o Messias de Israel, foi a sua obediência até à morte na cruz, a manifestação da glória de Deus em Jesus foi o cumprimento da sua missão que trouxe paz, salvação e comunhão, vida à humanidade.Somente o perfeito Deus e perfeito ser humano seria capaz de levar tal missão até o fim. Um ato de incompreensível graça e imensurável amor como esse é a verdadeira manifestação da glória de Deus.  

A manifestação de Deus se dá, então, no mundo das pessoas e no seu relacionamento com o ser humano. Deus não está numa outra esfera de vida, inalcançável a homens e mulheres, mas ao contrário, em nossa realidade ele manifesta a sua glória e majestade que trazem vida e redenção a todos que o recebem. 

A Epifania do Senhor é a manifestação do seu amor e de sua graça para com as pessoas. Não é a exibição de um deus vaidoso nem o poder de um deus dominador. É o amor do Deus que se faz carne para morrer e salvar, ressuscitar e dar vida ao ser humano.


Domingo, 15 de janeiro de 2017. 

A violência cotidiana.  

A violência tem sido uma triste companheira da história humana. Exemplos disso não faltam desde os tempos antigos até os mais recentes. No Brasil, o fim da censura aos meios de comunicação e a proliferação de programas de televisão que exploram a miséria e o sensacionalismo trazem cada vez mais uma sensação de insegurança. Nesse contexto surgem os oportunistas, como políticos e apresentadores de programas de televisão sensacionalistas, que apregoam o uso de mais violência como solução para os graves problemas que vivemos. 

Antes que se confunda o que vou escrever, afirmo que sou totalmente contra a impunidade e que todos devem responder pelos seus crimes. Sou tão a favor da punição que gostaria de ver na cadeia os que mataram Cláudia Lessin Rodrigues,Ana Lídia Braga e Araceli Cabrera Crespo, ou atearam fogo no índio, ou ainda atropelaram e arrancaram o braço do ciclista que trafegava no acostamento,dentre outros crimes impunes. Muitos outros crimes como esses acontecem dia após dia, mas seus executores não são punidos por serem filhos de famílias de posses. Os muitos mendigos que são incendiados em São Paulo não tem sua história explorada pelos apresentadores corajosos quando estão atrás das câmeras e mansos fora do set. Todos os que cometem crimes devem ser punidos na proporção da violência que perpetraram. Todos! 

Mas punição não pode ser confundida com mais violência. O Estado, que representa a sociedade, não pode agredir. Ele tem o direito de usar a força na medida em que ela é necessária para a manutenção da ordem e da justiça. O que vem, além disso, é abuso desnecessário e que transforma o Estado e a sociedade em criminosos do mesmo naipe dos que condena. O Estado não pode responder a violência com mais violência sob pena de construir a barbárie.  

Além disso, está mais do que provado que o uso de violência não detém a escalada da brutalidade. As polícias mais eficientes do mundo são as que menos usam de força. Os países mais seguros têm o aparato policial mais tranquilo. O que nos difere dessas nações não são as armas carregadas nem a brutalidade das forças armadas, mas o nível das escolas a que todos têm o direito de frequentar, a mentalidade ética em que as pessoas são formadas e que a justiça é igual para todos. E na época que tínhamos forças que prendiam, torturavam e matavam sem respeitar os trâmites da justiça, inclusive com apoio dos governantes, o país viva em ambiente de guerra com a violência proliferando de lado a lado. 

As pessoas se esquecem de que a criminalidade é um daqueles casos clássicos em que é muito melhor prevenir do que remediar. Prevenir com educação, cidadania e respeito ético. 

O cristianismo é consequência direta do abuso da autoridade, de um julgamento sem provas, de uma condenação à morte de um inocente. O cristianismo é consequência da violência praticada pela sociedade em nome de uma suposta ordem. É certo que Jesus veio para morrer e que ele entregou a sua vida por esse propósito. Mas esse fato não inocenta Pilatos, Caifás e tantos outros que estiveram envolvidos nessa farsa encenada pelos representantes da religião judaica e do governo romano da época. 

A agressão, a criminalidade e o desrespeito praticado gratuitamente nos provocam indignação. E devem mesmo provocar, pois não podemos concordar com a forma como os bandidos tomam conta de nossas cidades. Mas a violência não se combate com mais violência, pois assim ela se torna apenas vingança e não justiça. A violência se combate com justiça e paz. Disse Jesus: “Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5,9).


Domingo, 22 de janeiro de 2017.

A igreja e a cidade 

Na próxima quinta-feira, dia 26, a nossa cidade de Santos completa mais um ano devida. Já serão 471 anos, sendo uma das cidades mais antigas do Brasil. Sua rica história é testemunhada por antigas e belas construções como a Casa de Câmara e Cadeia, o Mosteiro do São Bento, a Igreja do Valongo e a Bolsa do Café. É também o porto mais importante da América Latina e uma das cidades mais ricas e com melhor qualidade de vida do Brasil e, sem dúvida, a mais importante da região. Os 7 km de Jardins da praia são motivo de orgulho para todos santista.  Por um lado, temos muito quenos orgulhar de Santos. 

Todo esse motivo de orgulho não pode esconder, por outro lado, os graves problemas que a cidade comporta, muitos dos quais deseja ocultar. A diferença na qualidade de vida entre as pessoas que vivem a beira-mar e os que moram nos morros, ou entre os que estão na Zona Sudeste e os da Zona Noroeste é enorme e vergonhosa. O porto que traz riquezas traz também drogas, prostituição e doenças.Apesar de sua relevância no quadro socioeconômico do estado e do país, somente a poucos anos a região recebeu uma universidade pública. 

Um dos seus maiores problemas é, sem dúvida, a falta de perspectiva de crescimento,tanto econômico como pessoal. Por sua causa, muitos de nossos jovens promissores têm buscado outros centros (alguns até menos importantes que a Baixada Santista) em busca de um maior desenvolvimento na carreira profissional. 

Nossa igreja está presente em Santos desde 1918, sem contar o tempo em que era congregação. Durante esses quase cem anos ela tem testemunhado a evolução da cidade e participado, de forma tímida ou ativa, conforme a avaliação que for feita. Mas aqui estamos. Somos seus cidadãos. Sua paz significa nossa paz, seu progresso significa nosso progresso, sua estagnação significa nossa estagnação.Desfrutamos de seus prazeres e sofremos seus problemas. E, se não nos colocamos como parte da solução, nos tornamos parte do problema. 

Outra questão é que temos uma grande responsabilidade para com a nossa comunidade. Se nela habitamos e desfrutamos do bem que ela nos oferece, ela é também o nosso mais próximo e mais importante campo missionário. Antes de pensarmos em ir a outras regiões, sejam elas distantes ou próximas. Santos é o primeiro lugar em que temos que proclamar o reino de Deus e a sua justiça, é aqui que precisamos testemunhar a boa nova de Jesus que transforma o mundo.

 

Assim, temos que oferecer soluções para os problemas da cidade. A principal colaboração que podemos oferecer aos santistas é outra visão do mundo. A vida não precisa ser apenas a alternativa entre a praia ou o shopping center. Deus não nos criou apenas para passarmos nossos dias desfrutando alguns prazeres efêmeros. Jesus nos chama a uma vida de amor e serviço ao próximo. Ele nos ensinou que aquele que serve descobre a felicidade e a realização pessoal. Por desfrutarmos do amor de Deus também fazemos de nossa existência um cuidar do outro, atentar para suas necessidades,oferecer perspectivas para que ele ou ela também desfrute de uma vida que tem sentido, não apenas pequenas alegrias. Oferecer uma nova perspectiva de vida é fazer a diferença na vida das pessoas. Se fizermos diferença na vida das pessoas, certamente faremos também a diferença na vida da cidade. 

Domingo, 29 de janeiro de 2017. 

Contemplação.  

Em nosso mundo pós-moderno é muito valorizado o fazer. As pessoas importantes são aquelas que fazem muitas coisas, geralmente grandiosas, tem a sua agenda cheia de compromissos e conseguir um horário para falar com elas é difícil e somente para aqueles que têm muito prestígio. Essas pessoas acordam muito cedo, dormem muito tarde e passam o dia fazendo e fazendo mais ainda. Nem no fim-de-semana descansam, pois estão repletos de compromissos sociais. Mede-se o lugar de alguém na sociedade pelo que ele fez ou faz de relevante. 

E, por mais contraditório que isso possa parecer, até mesmo para descansar as pessoas se ocupam de compromissos também cansativos. É só notar o quanto tempo se passa preso em engarrafamento nas estradas para passar um domingo disputando um palmo de areia na praia. Ou quanto se passa na fila para comprar um simples ingresso num cinema. 

Também no mundo eclesiástico parece ser assim. A igreja forte é aquela cheia de programações e eventos de diversas naturezas, em que as pessoas se ocupam todos os dias e todas as horas. O culto precisa ser movimentado e o é a tal ponto que não conseguimos ficar quietos nem mesmo na hora da oração silenciosa. 

Esse modo de vida e culto, embora tenha o seu valor, despreza uma das mais interessantes experiências cristãs: a contemplação. Para algumas pessoas contemplar é quase um sinônimo de observar, mas é mais do que isso. Porém a contemplação é muito mais do que isso. É o observar de forma concentrada e profunda, meditando sobre o que se contempla com tal atenção que se desliga do mundo ao redor e se liga ao objeto contemplado. É estar de tal forma aberto à voz do Senhor que se pode percebê-lo no poder dos seus feitos, na beleza da sua criação e na sabedoria de sua palavra. É orar com a alma, mais do que com a boca.É orar para ouvir e não para falar. É sentar-se aos pés do Senhor para ouvir,não para falar. 

Como não podemos ver o Senhor face a face, só podemos reconhecer a sua presença através do que ele nos revela sobre sua pessoa e de sua obra. Ao admirar a criação reconhecemos a beleza e a inteligência de Deus. Contemplar as obras do Senhor é deixar-se maravilhar, dentre outras coisas com a beleza e o perfume de uma flor, a força de uma tempestade, a ordem do universo e reconhecer por trás de tudo isso a criatividade, a inteligência e o amor de quem a tudo fez na sua perfeição. Esse maravilhar-se leva o ser humano à introspecção, à reflexão sobre qual o propósito de Deus ao criar toda essa perfeição. E meditar em quão distantes estamos deste propósito, qual a sua vontade para a nossa vida individual e coletiva, nossa incapacidade para retornarmos a ele e qual o caminho que o Senhor providenciou para sermos resgatados novamente para ele. 

Contemplar e meditar leva o ser humano a perceber a beleza da pessoa, da santidade, dos propósitos e do agir de Deus. Quão maravilhosos são os seus pensamentos e assuas obras! 

Em todo esse processo de abertura para o divino e retorno para o próprio coração,descobre-se o grande amor com que Deus tem amado o ser humano e demonstrado através de seu cuidado e da sabedoria de seus ensinos. Descobre-se que o amor de Deus pela humanidade é muito maior do que a capacidade da nossa compreensão.E que o Senhor não só tem cuidado de toda a criação como atenta com especial dedicação para cada um dos seres criados, para você e para mim.


Domingo, 05 de fevereiro de 2017.

O falar de Jesus 

Num belo texto da Bíblia, Jesus se apresenta como o bom pastor (Jo 10,11-16). Ele usa afigura do cuidador de ovelhas, bem conhecida dos seus ouvintes, para explicar de forma metafórica o seu relacionamento com os filhos de Deus, o seu cuidado para com eles e como eles confiavam no Mestre. Para destacara íntima interação que desfruta com seus seguidores, ele afirma um pouco depois: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem” (Jo 10,27). 

O interessante desse versículo é Jesus afirmar que é reconhecido pelos seus discípulos através da sua voz, da sua fala para com suas ovelhas. A fala é reconhecidamente um fator de identidade pessoal. Nós reconhecemos a voz e o jeito de falar das pessoas que nos são próximas. E existem até programas eletrônicos de reconhecimento de voz que distinguem com precisão uma pessoa de todas as outras. 

Quando Jesus afirma que os seus discípulos reconhecem a sua voz, porém, não estava se referindo a essa situação. Existem líderes cuja palavra é reconhecida pelos seus seguidores que obedecem a suas instruções, às vezes até incondicionalmente. Alguns desses líderes, como Mahatma Gandhi ou Martin Luther King, conduziram seu povo ou grupo a grandes feitos. Outros muitos conduziram seus seguidores a se tornar protagonistas de grandes tragédias na história. O fato comum é que tanto em um caso quanto em outro, o grupo fielmente seguiu as orientações do seu líder, do seu pastor. 

Os discípulos de Jesus conhecem a sua voz. Aqueles que ouvem a voz de Jesus o reconhecem e seguem. Ele não conduz os seus seguidores a tragédias, mas os conduz através de tragédias e a campos férteis e águas refrescantes. A voz do pastor transmite segurança e paz às suas ovelhas. Elas sabem que podem e devem segui-lo pois eles serão conduzidos ao campo adequado,ao lugar de descanso. As ovelhas sabem que o bom pastor as protegerá dos perigos do caminho. 

A palavra de Jesus aos seus discípulos é, antes de tudo,um chamado para que ouçam a voz do pastor e o sigam. Ele não obriga ninguém afazer isso, mas oferece o aconchego de sua proteção e direção. É um chamado e oferecimento, não uma convocação obrigatória. Responde a ele quem deseja se juntar ao rebanho do bom pastor. 

A voz do bom pastor é também voz de instrução, orientando cada uma das suas ovelhas através das trilhas errantes desse mundo desigual.Esses caminhos são cheios de percalços e armadilhas. A sua voz traz direção para que as ovelhas escapem deles e conforto e consolação para quando se machucarem neles. 

A voz do bom pastor também é de exigente repreensão quando uma ovelha se desvia do caminho. A sua veemência se deve ao cuidado que tem por elas e não deseja que nenhuma deixe de experimentar o repouso e a tranquilidade para onde as quer conduzir. 

A voz de Jesus cala tão profundo no coração de cada um dos seus discípulos que somos capazes de reconhece-lo apenas por chamar o nosso nome. Foi assim com Maria Madalena (Jo20,16). O chamado de Jesus tira os seus filhos de qualquer confusão. Pois o Mestre ama a cada um dos seus filhos de forma tão própria que cuida e fala com cada um de um modo especial. O importante é ouvir, reconhecer e seguir a voz do Bom Pastor.


Domingo, 12 de fevereiro de 2017.

O mundo que me espanta 

Já aconteceu comigo algumas vezes de estar na fila do caixa eletrônico quando o cliente da frente, geralmente uma pessoa idosa e humilde, se virar para mim e me entregar seu cartão e senha e pedir para que eu a ajudasse, sacando a sua aposentadoria,pois ela não sabe como fazer isso. O mundo de hoje é repleto de instrumentos,principalmente tecnológicos, que adentraram na vida das pessoas a muito pouco tempo (relativamente à história da humanidade) mas que influenciam decisivamente o seu comportamento, seu relacionamento interpessoal, suas atividades, sua administração do tempo, sua forma de pensar, etc. Hoje a gente se comunica rapidinho com quem está do outro lado do mundo, mas não sabe o nome de seu vizinho. 

O desenvolvimento tecnológico é tão intenso que aparelhos que até a pouco eram novidades, hoje são sucatas. Quem se lembra dos velhos videocassetes ou do tijolo que era a agenda eletrônica? Os telefones públicos, carinhosamente chamados de orelhões, quase desapareceram das ruas dadas a sua inutilidade atual. E as crianças de então, que brincavam na rua com carrinhos de rolimã ou jogando taco? A tecnologia mudou o mundo rapidamente nas últimas décadas. 

Mas não é só a tecnologia que causa espanto. Por mais que tenhamos avançado ainda somos frágeis frente a uma natureza que nos ameaça com tsunamis, terremotos, erupções vulcânicas, furacões e o desequilíbrio ecológico que produzimos. E, mais do que os desastres naturais, as situações provocadas pela humanidade ainda são mais aterrorizantes: a violência das perseguições e guerras políticas, a criminalidade e a falta de respeito com o ser humano, e a fome que assola grandes contingentes da população mundial. 

E nas situações provocadas por homens e mulheres, o que mais assusta é que poderiam ser resolvidas se houvesse mudança de mentalidade em muitos aspectos. Por exemplo, na questão da fome é fato que 5% da população mundial consome o equivalente a 60% da produção de alimentos. Há quem afirme que é seu direito, pois se eles pagam, tem o direito de levar. Mas o direito advindo do poder econômico não pode ser maior do que o direito ao alimento e à vida, inerente a todos os seres humanos. 

Desse modo nós voltamos ao círculo da vida e percebemos que as pessoas, embora dominem uma tecnologia cada vez mais avançada e transformadora, ainda hoje são egoístas, violentas, preconceituosas e pecadoras como sempre foram. E nem são mais felizes atualmente. O desenvolvimento da tecnologia não representa a transformação da mente e coração humanos. 

Essa transformação só acontece através da ação do Espírito Santo que leva à conversão a Jesus Cristo. Ele ensinou que no amor ao próximo, no compromisso solidário, no partilhar em lugar de acumular, no dividir o pão com sete e com oito, nisso está a felicidade. Uma alegria que o egoísmo humano não pode compreender e por isso rejeita. Procura felicidade em outras coisas e chama de louco quem não se rende à sua lógica. 

O mundo me espanta. Ele me espanta não pelo desenvolvimento tecnológico, mas pela arrogância humana – a semelhança dos construtores de Babel – que se acha capaz de construir sua própria realização através de suas próprias obras, seu próprio engrandecimento,seu próprio poder e não pelo relacionamento harmonioso com seu Criador e com seu semelhante.


Domingo, 19 de fevereiro de 2017.

O cristão e as mídias sociais 

A revolução tecnológica que vivemos trouxe a aproximação das pessoas através de diversos instrumentos de comunicação. Hoje é difícil a pessoa que não esteja conectada a pelo menos um dispositivo como internet, Facebook, WhatsApp, Skype,ou ao menos disponha de um aparelho de telefonia celular. Esses recursos estão tão presentes em nossa vida que nem imaginamos como seria viver sem eles. 

É verdade que a maioria deles foi criada a um tempo relativamente curto, porém transformaram profundamente a vida das pessoas. Um amigo me contou que a televisão chegou em sua cidade – Bagé, RS – quando ele já era adolescente. Antes dela, as famílias sentavam-se em frente às suas casas e conversavam, cantavam, educavam os filhos. Depois da televisão, as pessoas não saíam mais de casa e não mais conversavam não mais se conheciam. 

As maiorias das novas tecnologias estão voltadas para o campo da comunicação, muitas delas se propondo a estimular o contato interpessoal. De fato, vivemos um momento interessante do conceito de aldeia global: relacionamo-nos rápida e intensamente com quem está distante, mas não conhecemos o vizinho que mora ao lado. 

É muito bom que se tenha à disposição instrumentos que permitam conhecer, conversar,trocar informações e ideias com pessoas distantes, de culturas diferentes com outra visão de mundo. Tal diálogo é enriquecedor. Todavia, esses instrumentos são meios pelos quais transitam todo o tipo de comunicação, tanto a que edifica quanto a que agride. Não são poucos os que usam as mídias sociais para falar mal, difamar, roubar e atacar outras pessoas. 

Por sua natureza, as mídias sociais permitem ações e repercussões que nem sempre se percebe ou se está atento. Uma delas é que o que se escreve ou se mostra na internet não pode mais ser apagado ou esquecido. A palavra de incentivo ou de injúria ficou para sempre guardadas e como é comum, os elogios serão esquecidos, mas as agressões serão sempre lembradas. 

A Bíblia, logicamente, não trata das mídias sociais eletrônicas, visto que elas não existiam naquele tempo. Porém, o cuidado que ela recomenda no uso das palavras também norteia adequadamente a comunicação eletrônica. Dela, portanto,podemos extrair boas orientações. 

Em Pv 25,11, as Escrituras salientam o valor da palavra dita de forma correta em tempo oportuno. Uma frase que seria bem recebida em uma circunstância se transforma em agressão em outro contexto. Por isso, é preciso sabedoria tanto no quando e como se expressar quanto em entender o que se disse dentro de seu contexto. 

Já em Ef 4,29, o escritor sagrado nos ensina a só usar palavras que tragam edificação e não as que causam contenda ou agridem, constrangem ou ainda provocam dor em alguém.  Antes de falar ou postar é preciso pensar no que se fala ou no que se posta. 


Os meios de comunicação são preciosos instrumentos pelos quais podem transitar mensagens de paz, esperança e fé, mas também disseminam agressões, ódio e preconceito. Como cristãos precisamos ter cuidado tanto com o que expressamos quanto com as mensagens que recebemos. Saibamos usar esses instrumentos para a edificação e construção de uma vida melhor
Domingo, 26 de fevereiro de 2017.

O cristão e as festas populares 

O Brasil foi formado com fortes contornos da cultura católica portuguesa e o protestantismo que aqui chegou tanto foi rejeitado por essa cultura quanto a rejeitou, em especial no que é referente a muitas de suas manifestações populares. É fato que o próprio calendário civil atende aos interesses da igreja romana e impõe seus costumes e crenças a todos os brasileiros, inclusive aqueles que não celebram essa mesma fé. Os feriados nacionais de Corpus Christi e 12 de outubro são exemplo disso. 

Mas acultura vai além do calendário civil. Nossa hinologia, por exemplo, é basicamente estrangeira, letras traduzidas e ritmos importados. Dizemos que cantar a Deus em ritmo de samba, frevo ou chorinho é blasfêmia, mas cantamos rock, twist, e outros que são tão profanos quanto. 

E quanto às festas populares, o que se há de dizer? Até há pouco tempo crente não dançava quadrilha, não participava de festa junina, pois estas estão associadas aos santos. É bem verdade que a quadrilha que certos pastores frequentam hoje é outra, infelizmente. Mas é muito gostoso comer pamonha, pipoca, pinhão, e outras delícias dessa época. O interessante é que muitos dos que condenam o crente participar de quermesse participa de Halloween, festa americana ligada à bruxaria.

O carnaval, então, é considerada a pior de todas as festas, afinal ela está ligada à sensualidade e não faltam pessoas cometendo pecados nessa área. Há mesmo escândalos e folias que nos trazem total repulsa em virtude da degeneração que ali é praticada. Parece que tudo que é ligado ao Carnaval degrada o ser humano. 

Isso não é bem verdade. Se há, como de fato há, um lado que sensualiza da pior forma possível essa festividade, há também muitas expressões interessantes de cultura popular, como os bonecos gigantes de Pernambuco. Há também a ácida e pertinente crítica política em forma bem humorada daquilo que em outros povos é feito com destruição e revolta. 

Penso até que o carnaval deva ter no seu início alguma ligação com a tradição cristã. Explico: ele termina exatamente quando inicia a Quaresma, período do ano cristão dedicado à reflexão, contrição, confissão de pecados e espera pela Páscoa. Há outra sutil, mas importante ligação: no domingo de carnaval, o calendário cristão comemora a Transfiguração do Senhor. Transfiguração, em grego, é metamorfose, ou seja, mudança de forma. Essa mudança de forma. Penso eu, deve estar na origem das fantasias carnavalescas. 

A grande diferença é que as fantasias da festa de Momo se rasgam e são jogadas fora na Quarta-feira de Cinzas. A metamorfose provocada pelo Espírito de Deus é permanente, não degrada, mas edifica, não traz vergonha, mas alegre sentimento de aceitação e de pertença ao reino de Deus. 

O reino de Deus, entretanto, não nos tira do mundo e da cultura em que vivemos,ao contrário. Jesus nasceu, viveu e morreu inserido em uma cultura e participou ativamente de seus elementos, de suas festas, religiosas ou não. Não estou comisso defendendo que ninguém deva pular o carnaval, que isso fique bem claro, até porque não acho que tal prática traga qualquer benefício, muito pelo contrário. Os problemas decorrentes de abuso de sexo, bebidas e uso de drogas são bem conhecidos. O que defendo é que não podemos negar ou nos afastar de nossa bela herança cultural brasileira, pois ela também é uma dádiva de Deus. 


Domingo, 05 de março de 2017.

Quaresma e arrependimento 

Desde a última quarta-feira, chamada de cinzas, entramos no período do calendário litúrgico chamado de Quaresma. Trata-se de um período de quarenta dias antes da Páscoa e que serve para a preparação das comemorações da morte e ressurreição do Senhor. Nós, protestantes brasileiros, com pouca tradição no campo da liturgia e especialmente na guarda do calendário cristão, achamos que essa época é só aquele tempo em que os católicos não comem carne. 

A quarta-feira não se chama cinzas por acaso. As cinzas são usadas em diversas passagens da Bíblia como símbolo da contrição e arrependimento, não só individualmente como também coletivamente, até mesmo por todo o povo. Elas são sinal exterior de uma contrição interior, uma demonstração visível do arrependimento existente dentro do coração da pessoa. A designação deste dia com este símbolo aponta para todo o restante do período como uma época dedicada à contrição e ao arrependimento. 

Que ninguém pense que este dia simbólico tem a ver com o fim do carnaval e compossíveis excessos que as pessoas tenham praticado durante o período da folia.

Certamente que o carnaval é marcado para antes desse período, mas não o contrário. E a Páscoa é celebrada desde muito antes do carnaval. E, mais importante, a Quaresma não é período de arrependimento apenas do que se faz na festa de Momo, mas no ano inteiro. Pecado não se pratica apenas em meio a confetes e serpentina. 

Assim a Quaresma é tempo de contrição e arrependimento, é preparação para a Páscoa. É tomada de consciência de que foi por nossa culpa que o Filho de Deus morreu na cruz do Calvário, foi o nosso pecado que ele carregou em tão terrível castigo. O caminho para a Páscoa não é um caminho fácil. É verdade que a cruz se completa na ressurreição, o pecado é curado com a graça da salvação. Mas para chegar ao túmulo vazio é preciso passar pelo Calvário. Não há salvação sem conversão, e esta sem contrição e arrependimento, como também não há arrependimento sem mudança de vida. 

O arrependimento, ao contrário do que muitos pensam, não é só um sentimento de culpa ou constrangimento ante a percepção de que se errou ou se magoou alguém. Ou o discernimento de que se quebrou algum mandamento. Ele é uma firme tomada de consciência do que é o errar o alvo, do desviar-se dos desígnios de Deus, do romper com os propósitos de justiça e paz do Senhor para com toda a criação. 

Por isso a Quaresma é tempo também de introspecção e reflexão. É tempo de cada um avaliar a sua vida, os direcionamentos e propósitos que se tem colocado a si mesmo. Mais importante do que refletir sobre este ou aquele ato específico é meditar sobre os valores que tem norteado a sua existência. Usando uma figura de linguagem, mais importante do que pensar sobre cada estação é reconhecer os trilhos nos quais correm o seu trem.  

Ao chegarmos ao tempo da Quaresma, estejamos menos preocupados com o que comer ou beber, e mais interessados em usar esse tempo para conversar francamente com Deus, avaliando a nossa vida e existência segundo os seus critérios, conforme os seus santos e divinos propósitos.


Domingo, 12 de março de 2017.

As mulheres no ministério de Jesus 

Na última quarta-feira, dia 8, foi comemorado o Dia Internacional da Mulher. Sinceramente,fico dividido quanto a datas como essa. Por um lado, penso que todos os dias deveriam ser das mulheres, dos homens, das crianças, dos idosos, enfim, se é preciso dedicar um dia é porque a condição que deveria ser normal e justa está prejudicada e é preciso chamar a atenção para isso. Por outro lado, e reconhecendo que, de fato, não existe a condição de igualdade entre homens e mulheres nem mesmo no ideal das mais altas instâncias governamentais, é mais do que necessário a celebração de uma data que chame a atenção para essa realidade e levar à reflexão e transformação desta condição. 

Tal reflexão deve começar a partir da Bíblia, com especial atenção à pessoa de Jesus e seu ministério, paradigma para nossa vida e ministério. Muitas foram as mulheres que interagiram com Jesus durante sua vida e ministério. Não haveria espaço para citar todas. Por isso, nos detemos em algumas, não porque sejam mais importantes do que outras, mas apenas porque elas nos chamam a atenção por algum motivo. 

A primeira dessas mulheres é Maria, sua mãe, lógico. Ela foi a única pessoa presente em toda vida terrena de Jesus, desde seu nascimento até a sua morte.E, embora não haja nenhum registro bíblico disso, não é difícil imaginar que o Mestre esteve com ela em algum momento após a ressurreição. Ele teve com sua mãe uma relação de conflito (Lc 11,27, Mt 12,46-50) mas também de atenção e cuidado (Jo 19,26-27). Essa mesma tensão se verificou na relação com seus discípulos mais próximos, o que demonstra que não significava desprezo ou rejeição de Jesus por ela, mas a prioridade de seu ministério. 

Outra mulher de atuação bastante significativa no ministério de Jesus foi asiro-fenícia (Mc 7,24-30). Ela aparece em apenas uma passagem e é citada em apenas um dos evangelhos, mas é importante porque foi a única pessoa que convenceu, com sua palavra, Jesus a mudar de opinião. Ela nos dá uma preciosa lição, a de que a vontade de Deus não é uma decisão fechada, mas que ele está aberto a ouvir nossas petições e, se for o caso, até a mudar a sua vontade. 

Outra relevante lição vem de Maria, irmã de Marta, que nos ensina que o que mais importa é sentar aos pés do Mestre para ouvir o que ele tem a nos instruir, mais do que correr agitadamente lhe oferecendo o que ele não está tão preocupado em receber. Já o diálogo com a mulher samaritana revela Jesus totalmente despido de preconceitos e quebrando os tabus de sua cultura e sua época. E à mulher pega em adultério ele trata com amor, perdão e oportunidade de uma nova vida, a despeito do machismo dos seus detratores. 

De todos os seus discípulos, homens ou mulheres, o papel mais importante em todo o ministério de Jesus foi o protagonizado por Maria Madalena. Coube a ela ter o privilégio de ser a primeira pessoa a testemunhar Jesus redivivo e anunciar a sua ressurreição (Jo 20,11-18).  Ela foia portadora da maior notícia em toda a história da humanidade: Vive o Senhor, a morte foi vencida! 

Desse modo vemos que várias mulheres acompanharam o Senhor em seu ministério. Mesmo no momento de maior dore angústia, quando a maioria de seus apóstolos o haviam deixado, as mulheres estavam com ele (Jo 19,25). Contra a cultura dominante de seu tempo Jesus as tratou em iguais condições dos homens, considerando-as com as mesmas responsabilidades e direitos. Para Jesus, todo dia era dia das mulheres, dos homens e de todos.


Domingo, 19 de março de 2017.

Hoje eu não quero sair de casa 

Há dias em que o que menos se quer é sair de casa. Seja por causa da chuva e do frio e da vontade de se enfiar debaixo de um cobertor e se jogar no sofá com uma caneca de chocolate quente e uns bons filmes para assistir. Ou talvez por aquela necessidade de descanso, quando o corpo pede por algumas horas de cama após algum tempo de trabalho intenso, pesado estafante tanto física quanto mentalmente. Seja ainda pelo medo causado pela insegurança de nossos dias manifestada nas imagens dos programas de fim de tarde da TV que nos avisam que se sairmos de casa não temos garantia de que voltaremos. Ou seja pelo simples desejo de se estar com os mais queridos, passar algum tempo com os nossos mais próximos, aqueles que fazem parte do círculo mais fechado de nossa vida. O fato é que há muitos motivos para não sair de casa. 

A casa da gente evoca uma série de sensações positivas como abrigo frente ao frio intenso ou ao calor escaldante, segurança frente aos inimigos perigosos, descanso do labor cansativo, a companhia dos queridos e muitos outros, A casa é lugar de paz, proteção, alegria, amor e esperança. Podem soprar os ventos e cair a tempestade sobre ela que confiamos na sua resistência e proteção. Pode o mundo se agitar que em nosso lar encontramos paz. 

Há, porém, um outro lugar onde a paz é mais verdadeira, a segurança é mais forte, a alegria é mais espontânea, o amor excede a todo o entendimento, a comunhão é mais intensa e a esperança é mais vívida. É também uma casa. É a casa de Deus. 

Nos acostumamos a chamar a igreja que frequentamos de Casa de Deus. No nosso caso, há ainda um precioso reforço que é o dístico colocado na fachada do templo:“Casa de oração para todos os povos”. Para nós a igreja á a casa do Senhor onde encontramos nossos amados irmãos para desfrutar da comunhão, lugar em que nos sentimos compelidos à meditação e oração, espaço privilegiado para a leitura e estudo da Palavra de Deus. 

Só que não é dessa casa que eu estou falando. A casa a que me refiro não é construída de tijolos, cimento e areia; não tem portas ou janelas e nem mesmo um teto. Não é um edifício que possa ser derribado por uma grande tempestade. Eu me refiro ao coração do Senhor, ao seu amor que vai além de toda e qualquer compreensão, ao poder do qual não existe força no universo capaz de nos tirar dele. 

Nele o angustiado experimenta paz, o desesperado recebe fé, o solitário é acolhido em verdadeira comunhão, o perseguido encontra segurança e o oprimido é liberto. Se viver em uma casa segura, bonita e confortável é motivo de descanso e satisfação, habitar no tabernaculo do Senhor é experimentar a cada dia o prazer da vida em sua plenitude, a construção do ser pessoal em todas as suas dimensões. 

Esta é uma casa para a qual todos são convidados, cuja porta está aberta a todos que quiserem entrar, estejam em que situação estiverem. A única condição é entrar com o coração igualmente aberto para ouvir a palavra do Senhor e viver a nova realidade que ele tem a nos propor. Uma casa que, por ser a casa do Senhor, pode ser minha e de quantos mais quiserem nela entrar e morar. 

Por isso eu hoje não quero sair de casa. Nem hoje, nem amanhã, nem nunca. Não quero sair da casa do Senhor, que ele faz ser minha casa. Casa onde me sinto seguro, acolhido, amado e em perfeita paz.


Domingo, 26 de março de 2017.

Em me vindo o temor, hei de confiar em ti 

O livro de Salmos é particular na Bíblia. Além de ser o maior de todos, é o que mais claramente expõe a palavra humana dirigida a Deus.Se em todos (ou quase todos) os outros livros lemos o que o Senhor tem a dizer para nós através de ensinos, mandamentos, exemplos, etc., nos salmos nós lemos o que servos de Deus no passado lhe disseram. Essas palavras são a resposta humana às mais variadas experiências pelas quais se pode passar nesta vida,desde o nascimento até à morte, dentre elas a perseguição e o livramento, a vitória e a derrota, a súplica e a gratidão, o louvor e o ensino. 

Tais palavras se tornam como paradigmas para as nossas experiências e para as respostas que devemos lhes dar. Isso não significa que as nossas experiências sejam as mesmas e que as respostas tenham que ser exatamente iguais, mas que as palavras dos servos de Deus no passado servem de parâmetro para as orações dos servos de Deus do presente. 

Um exemplo é a afirmação de fé que está escrita no Sl 56,3 e que serve de título a esse texto. Neste salmo o salmista se vê perseguido e ameaçado por inimigos poderosos. Além da perseguição que ainda hoje existe, muitos  outros motivos  de temor assaltam os   que seguem os ensinos do Senhor. A expressão do escritor neste verso demonstra isso: em me vindo o temor. Ele não cogita uma possibilidade de vir o temor ou não, pois se assim fosse diria: se me vier o temor. O temor é certo que virá, embora nem sempre da mesma fonte. 

Há temores que vêm de causas naturais como tempestades, terremotos, secas prolongadas, calores intensos ou nevascas assustadoras. Há ainda um sem-número de enfermidades que ameaçam nossa integridade física com maior ou menor grau. Além dessas, há outras fontes de temores naturais. E também existem incontáveis medos produzidos por outros seres humanos como perseguições, violência, etc. Podemos não saber quando, em que intensidade e nem de onde, mas o certo é que em algum momento seremos de alguma forma ameaçados. 

Se a vinda do temor é inequívoca, diversas podem ser as reações a ele. Uma delas é a tentativa de fugir do perigo, sábia decisão, mas nem sempre eficiente, visto que há situações das quais não é possível se ausentar. Pode-se querer enfrentar as ameaças sozinho, sem a ajuda de ninguém, sentindo-se capaz de vencer o inimigo que o cerca. Muitos acharam-se fortes assim, porém erraram do julgamento do oponente e sucumbiram ante uma força maior.  Existe a possibilidade de se refugiar em muitas alternativas que o mundo apresenta, algumas legítimas outras nem tanto. O seu alcance, no entanto, é limitado, e mesmo quando eficiente, depende do apoio do Senhor, pois se ele não guardar a cidade, em vão vigia a sentinela. As reações humanas não são suficientes para deter as muitas ameaças que rodeiam o ser humano. 

Toda a segurança diante de qualquer forma de ameaça vem do Senhor. Ele detém o controle sobre todos os fatores, naturais ou não.  Ele tem o cuidado dos seus filhos em todas as áreas. Isso não significa que seus amados não possam ser tocados ou sofrer aflições. O Senhor, no entanto, é refúgio seguro ante qualquer tribulação. Só ele garante paz e segurança a todos os seus filhos. Só nele se pode confiar quando vem o temor. Só nele se deve confiar quando vem o temor, visto que ele não somente pode salvar o ameaçado como de fato age em favor de seus filhos. 


Domingo, 02 de abril de 2017.

O Senhor proverá 

O capitulo 22 de Gênesis narra como o Senhor pediu que Abraão oferecesse a ele em sacrifício o seu único filho, Isaque. Abraão levou seu filho ao monte que Deus havia determinado para a realização da oferenda. Chegando lá e, não vendo nenhum animal que pudesse ser utilizado no ritual, Isaque perguntou ao pai onde estava a presa, ao que o patriarca respondeu: O Senhor proverá! De fato,após provar a fé de seu servo, Yahweh enviou um cordeiro para tomar o lugar de Isaque. 

A expressão O Senhor proverá tornou-se uma afirmação de fé entre aqueles que, como Abraão, confiam em Deus. É a assertiva da confiança de que Yahweh, no momento certo, há de oferecer os meios para suprir as necessidades daqueles que lhe são fiéis. 

Não é raro que se interprete e se pense nas provisões divinas relativas às necessidades materiais como comida, vestuário, habitação, etc. É fato que o Senhor cuida dos seus amados e lhes provê a cada dia o pão necessário para a sua subsistência. Incontáveis são os testemunhos ao longo dos séculos do cuidado do Senhor ante questões de sustento material dos seus filhos,experiências de que o pão de cada dia é dado no momento certo e não vem a faltar. Por isso podemos crer que o Senhor proverá.

Só que o cuidado de Deus vai muito além da dimensão econômica. Considerar que o zelo do Senhor dos Exércitos abrange somente os aspectos materiais da vida é empobrecer e muito a sua ação por nós. Não podemos nem mesmo dizer que sua principal atenção seja essa. Deus olha para o ser humano como um todo em todas as suas dimensões, sejam elas pertinentes ao indivíduo ou à sociedade em que ele está inserido. E cuida de todas elas.

A história narrada em Gn 22, inclusive, não trata de questões financeiras, mas da entrega do filho em sacrifício a Deus. Abraão não estava prestes a imolar Isaque porque lhe faltava dinheiro ou algo parecido, mas para ser fiel a Yahweh. E a narrativa mostra que o Senhor não quer sacrifícios humanos. O ser humano foi criado para ser amado pelo seu Criador, não para morrer para ele. A providência do Senhor se manifestou em apresentar um animal que substituísse o jovem como sacrifício. 

A providência divina nos ensina também esse texto, vem sempre no tempo certo.Deus não deixa para depois. No momento certo que Abraão precisou dela, antes que lançasse mão de seu filho. 

O cuidado de Deus também se manifesta de modos impensáveis pelo ser humano. Quem haveria de imaginar que um cordeiro fosse achado sozinho naquela região? Pois Deus age de modo inesperado. 

O Senhor provê seus a filhos em todas as dimensões da vida. Se na enfermidade, provendo cura; se na aflição, provendo esperança; se na dor, provendo consolação; se na fome, provendo pão. Ele pode prover porque está com seus amados todos os dias e conhece as suas mais intensas necessidades, materiais ou não. 

Tal atitude não significa que ele incondicionalmente atenderá os desejos do coração humano. Ele tem os seus desígnios e tudo faz para o seu cumprimento. E ele conhece melhor do que nós mesmos o que nos é melhor ou mais necessário. Nos seus desígnios está o seu grande amor para com o ser humano, de modo que ele não deseja o sofrimento e a dor, mas a satisfação e plena realização de cada pessoa. Por isso podemos confiar que o Senhor proverá.


Domingo, 09 de abril de 2017.

Jesus ou Barrabás? 

Embora os quatro Evangelhos narrem a vida de Jesus, são poucos os episódios contados por todos eles. Um desses é a cena, durante o julgamento de Jesus, em que Pilatos oferece à multidão libertar um prisioneiro, no caso o Mestre como era costume na festa da Páscoa. Os evangelhos divergem um pouco na forma de contar esse episódio, mas todos concordam que a multidão pede Barrabás. 

Não sabemos muito a respeito deste homem,apenas o pouco que a Bíblia nos informa, de que ele estava preso por participar de uma insurreição na cidade e pela morte de uma pessoa. A partir daí podemos fazer algumas suposições. Não era incomum que na época da Páscoa surgissem insurreições de caráter messiânico em Jerusalém. Afinal essa festa trazia à memória a libertação do cativeiro no Egito e eles lembravam que agora estava sob domínio romano. Daí a pensar que o mesmo Deus que os libertara do Egito enviava um líder para os livrar de Roma era um passo fácil. As revoltas eram tantas que a guarda romana costumava triplicar seu efetivo em Jerusalém nesses dias. 

Não é errado, pelo contexto, imaginar que Barrabás tivesse sido preso após o levante de um  desses grupos, principalmente pela informação que morreu uma pessoa. Ele não devia ser reconhecido como um líder do grupo, visto que, se o fosse, jamais Pilatos permitiria a sua soltura.  

Eles tinham como projeto a recuperação da autonomia estatal de Israel frente a Roma e eram formados pela elite de Jerusalém. Essa elite tinha no templo a sua base ideológica e econômica e dominava as camadas mais baixas o povo, os camponeses. Sua proposta era se libertar dos romanos para continuar dominando sobre os pobres. 

Jesus se opôs a esses grupos. Ele expulsou do templo aqueles que faziam da casa de oração um covil de ladrões e salteadores. Logo em seguida secou a figueira (símbolo de Israel) que não produzia fruto. Jesus se solidarizou com os grupos a quem eles já exploravam e pretendiam ampliar sua força: galileus, samaritanos e judeus das cidades periféricas de Jerusalém. A libertação de Roma nada significaria, para Jesus, se continuasse a dominação da elite de Jerusalém sobre os outros grupos de Israel. 

A multidão que comparece perante Pilatos é composta pelos que moravam na capital, sua elite e seus aliados, não pelos peregrinos que ficavam fora dos muros da cidade. Esse multidão tinha seus interesses políticos e econômicos ligados ao templo e ao ideal que Barrabás representava. Jesus era o oposto a tudo que eles queriam. Por isso foi fácil a escolha que fizeram. Fácil, mas injustificavel. Pois que rejeitaram o Senhor a partir de seus interesses de dominação dos humildes e enriquecimento a custados mais pobres. 

É verdade que ao escolher Barrabás e rejeitara Jesus, a multidão nada mais estava fazendo do que encaminhar os propósitos de Deus, afinal o Senhor veio para morrer na cruz. Mas isso não tira deles a culpa por sua escolha mesquinha. 

De nossa parte, não podemos criticá-los, visto que, às vezes, também comentemos o mesmo erro. Dentre as opções que a vida coloca à nossa frente escolhemos aquela que atende a nossos interesses particulares, às vezes até mesmo ilegítimos, e não ao que corresponde à proposta do reino de Deus. É preciso avaliar e escolher com cuidado as opções que fazem so para não pensar em satisfazer nossos desejos e ir contra a vontade de Deus. Entre Jesus e Barrabás, saibamos fazer a escolha certa. 


Domingo, 30 de abril de 2017.

Levem-no à forca 

No meu tempo de primário – como se chamavam na época os primeiros anos do ensino fundamental – uma professora nos contou a história de um rei que, totalmente afônico num dia, resolveu passar as suas ordens através de bilhetes. E eis que um nobre muito chato entrou na sala do trono e começou a importuná-lo com pedidos sem o menor sentido. O rei já irritado com a sua doença e incapacidade de falar, ficou transtornado com a inconveniência do súdito e mandou que o levassem embora, ainda que para isso a guarda precisasse ser chamada e escreveu num bilhete: “levem-no à força”. Mas o rei não era somente intolerante, como também cometia os seus equívocos na escrita e, desta vez, esqueceu de colocar a cedilha. Quando perceberam o erro, já era tarde. 

A lembrança desta história me veio à mente esses dias por causa dos muitos mal-entendidos – e suas consequências desagradáveis – que já presenciei por conta de palavras mal colocadas e/ou mal interpretadas nas chamadas redes socais. 

Normalmente a comunicação escrita não é tão clara quanto a oral, visto que a frieza da grafia não tem como representar a entonação, as pausas e ênfases, os gestos ou a feição de quem fala e muito menos a de quem é o receptor da fala. Mesmo a comunicação oral apresenta, muitas vezes, distorções entre o emissor e o receptor, chamadas de ruídos. Quantas vezes já não falamos algo e os nossos ouvintes entenderam totalmente diferente? Se isso acontece na fala, quanto mais na escrita. 

Tal condição tem piorado ao longo dos últimos anos, devido a dois fatores. O primeiro é a contínua decadência da educação escolar. Muitas crianças passam o tempo na escola, mas não são alfabetizadas. Hoje um aluno chega à faculdade sem saber a diferença entre substantivo, adjetivo ou verbo. E qual a diferença entre a segunda e a terceira pessoas? Poucos usam a pontuação adequadamente. Isso sem falar em problemas da língua que desafiam até os catedráticos. 

Outra situação que traz à tona esses problemas é o crescimento da comunicação imediata pelas redes sociais. Os facebooks e whatsups da vida são responsáveis por muitos mal-entendidos pois, se são instrumentos rápidos, são igualmente potenciais geradores de erro. Em primeiro lugar porque é extremamente difícil digitar as letras num teclado tão minúsculo, na velocidade exigida. Em segundo lugar porque esses programas usam corretores que em geral não corrigem, mas estragam o texto que escrevemos. Várias vezes digitei Mongaguá e o corretor mudou para Mongólia. Se a igreja tem alguma congregação na Mongólia, eu não sei, mas sei que nunca a visitei. E, o mais importante, dificilmente alguém revisa o texto digitado antes de enviar (para o endereçado correto ou não). Portanto, as redes sociais são um potencial criador de erros de comunicação. 

Essas mídias ainda são muito novas e estamos nos acostumando a elas. Ainda não criamos consenso a respeito do seu potencial e dos vários problemas que elas podem representar. Por isso, enquanto não há consenso, vale o bom senso. E o bom senso diz que é preciso cuidado com o que se escreve, pensar com cuidado o que se vai escrever e pesar cada palavra, imaginando não o que se quer dizer, mas o que o outro vai ler. O bom senso ensina também a ter calma com as mensagens que se recebe e, principalmente, com quem as envia. Se alguma informação não foi bem entendida, procurar outro meio de comunicação para esclarecer qualquer dúvida. 

Afinal,como dizia a antiga canção: palavra não foi feita para dividir ninguém, palavra é o instrumento por onde o amor vai e vem


Domingo, 07 de maio de 2017.

A família com Deus 

No imaginário popular, maio é chamado de o mês das noivas. Não tenho certeza de onde venha essa tradição, mas ouvi dizer que se deve ao fato de que, nos frios países da Europa, essa época é primavera, quando o tempo começa a esquentar e permite que as pessoas tomem banho (nos idos em que não havia água quente) e as noivas fiquem perfumadas para a união. Os imigrantes europeus que para cá vieram trouxeram esse costume, mesmo estando nós em uma região quente e na qual maio é outono, quando começa a esfriar. Até hoje muitos casais agendam seus matrimônios para maio por conta da tradição. Essa explicação faz sentido,embora não possa ter certeza da sua veracidade. 

Fato é que nossas igrejas incorporaram a tradição e a ampliaram, fazendo de maio o mês não somente das noivas, mas de toda a família. Esta, como toda iniciativa que valorize a família deve ser prestigiada. A família é uma instituição que, a despeito das inúmeras transformações que sofreu e ainda sofre ao longo do tempo, permanece como a base de qualquer sociedade, seja qual for a sua configuração. A família forma a sociedade e não o contrário.

Para nós, cristãos, há ainda outro elemento: a família é uma bênção de Deus para nós e é nossa atribuição a sua contínua edificação. Sim, ao contrário do que divulgam os romances populares, a história não termina no dia do “sim”. Ela inicia aí e continua a cada dia até o fim de nossos dias sobre a face da terra. E cada dia que passa deixa as suas marcas, mais ou menos evidentes. 

Sabemos que para que essa dádiva divina seja sempre uma verdadeira bênção e não se torne uma maldição, precisamos da ajuda que somente o Senhor pode nos dar. É certo que a orientação, o apoio e o exemplo de pessoas mais experientes na vida podem ser de grande valia, e tal sabedoria também é um presente de Deus. É ele quem coloca as pessoas certas, com palavras adequadas e oportunas em nossa caminhada. É dele que vem esse auxílio. 

Como todo relacionamento que se estende por muito tempo, a família também há de atravessar diferentes fases na sua jornada. Haverá de enfrentar tempos bons e tempos difíceis, dias de estabilidade e crises que a ameaçará. Algumas pessoas dizem que é preciso buscar ao Senhor para enfrentar as situações difíceis. Mas Deus não é apenas um auxílio para as horas de aflição. Ele deve ser Senhor de nossos lares em todo o tempo, em todas as circunstâncias, não só nas que nos afligem. Jesus não somente acalmou a tempestade como também navegou com os discípulos em muitas outras ocasiões. Ele tem que ser sempre buscado e em todo o tempo estar presente em nossos lares. Jesus não pode ser uma visita ocasional, mas um membro presente e ativo na família. 

A responsabilidade de cada membro da casa, em especial do marido e da esposa, pai e mãe, não é diminuída à medida que cresce a influência do Senhor sobre a família, ao contrário, cabe a eles a tarefa de buscar em Deus o amparo e a direção para si e para os seus. O cristão é consciente de que sozinho nada pode, mas que também não pode se omitir da responsabilidade de construir o seu lar. É no contínuo diálogo com o Senhor que construímos a nossa existência, tanto pessoal quanto familiar. Sem ele nada somos, mas também não somos meros expectadores do agir divino. Junto com o Senhor edificamos famílias sólidas e lares bem estruturados. 


Domingo, 28 de maio de 2017.

O Deus dos pais 

Um aspecto não muito comentado nas igrejas a respeito do período dos patriarcas e matriarcas de Israel e Judá é que eles não conheciam a Deus como nós o conhecemos hoje. Precisamos lembrar que o Senhor foi se revelando ao longo da história e que na antiguidade eles não tinham a Bíblia e nem Jesus ainda tinha vindo. Por isso, embora adorassem o mesmo Deus que nós, não o compreendiam como nós o entendemos atualmente. 

Eles e elas não chamavam a Deus por Yahweh, pois este nome só foi revelado a Moisés no episódio da sarça (Êx 3) e nem tinham ideia de uma divindade que habitasse num templo. Aliás, nas narrativas patriarcais, não encontramos Abraão, Isaque ou Jacó em qualquer templo, mas eles realizavam seu culto em casa, praticavam o sacrifício onde estivessem e se reuniam com outros para adorar a Deus em lugares como o carvalho de Manre ou o poço de Berseba. Eles conheciam ao Senhor por vários nomes, de acordo com a localidade em que o encontraram ou segundo algo que lhes tenha feito: El Shaday, El Eliom, ou outro. O epíteto mais comum para designar o Senhor, no entanto, era se referir a ele como Deus de um antepassado: Deus de Abraão, Deus de Isaque. 

Isso não significa que eles adorassem outro deus, absolutamente. Apenas o conheciam por outro nome. No já citado episódio da sarça, Yahweh afirma a Moisés que ele é o Deus de Abraão, Isaque e Jacó (Êx 3,6).

Mas, na sua maneira de conhecer ao Senhor, Deus tinha algumas características que nem sempre nos lembramos e, esquecer delas é um grande prejuízo à nossa fé. 

A primeira e a mais evidente delas é que Deus era Deus da família. Isso significa que o Senhor estava atento aos desafios que a unidade familiar enfrentava e aos percalços que ela sofria. E cuidava dessas situações. O Deus dos patriarcas e matriarcas de Israel e Judá se envolve em questões como geração da descendência, criação de filhos, conflito entre esposas (era uma sociedade que aceitava a poligamia) e irmãos, tensões entre a casa e os governantes, etc. Questões tipicamente familiares. Assim, Deus estava na casa, atuando na condução da vida das pessoas. 

Em decorrência disso, percebemos que Deus é bem próximo e presente do cotidiano daquelas pessoas. Ele estava tão inserido em sua vida que, com alguns, até falou diretamente. O Senhor não estava distante no céu ou em um templo imponente,construído com pedras, mas junto com eles onde quer que estivessem. Considerando que Abraão e seus familiares eram nômades (ou melhor, seminômades), Deus caminhava com eles no caminho que percorressem. Eles não tinham que ir a um lugar para encontrar ao Senhor, pois ele os acompanhava onde quer que estivessem. Ele estava no campo com os pastores do rebanho, na casa com as mães cuidando de seus filhos e os acompanhou até mesmo na distante terrado Egito, quando um deles é vilmente vendido por seus invejosos irmãos. O Senhor cuidava deles nos seus desafios cotidianos. 

Nesse contexto o culto a Deus não era cheio de rituais ou teatralidade, imponência e nem grandes apresentações, mas acontecia de modo singelo no meio da família. O primeiro templo era a casa e o primeiro sacerdote, o pai de família. A família era a igreja. Mais importante que os rituais no templo era a adoração no meio da família. Nem por isso, Deus se agradava menos do culto que lhe era prestado. Ao contrário, as narrativas bíblicas demonstram o quanto o Senhor se agradava dessas pessoas. 

Deus, hoje, continua sendo próximo, acompanhando seus filhos por onde quer que um deles vá, cuidando dos desafios familiares, presente no cotidiano daqueles que são seu povo. Participa de suas alegrias, aflições e preocupações. Embora, talvez, os desafios possam ser outros, a sua presença continua a mesma junto aos seus. O mesmo Senhor está atento ao dia após dia dos seus filhos. Do mesmo modo, as casas dos filhos de Deus precisam continuar a ser o mais importante lugar de adoração ao seu nome. 


Domingo, 04 de junho de 2017.

O Pentecoste cotidiano 

O surgimento e alastramento de um segmento cristão a partir do início do século XX fez com que parecesse a um grande número de pessoas que o adjetivo pentecostal estava restrito a essas igrejas e comunidades. Tal pensamento está completamente errado a partir do fato de que hoje não podemos falar de igrejas pentecostais como pertencendo todas as um único grupo, com características doutrinárias, comportamentais e estruturais semelhantes. É só comparar, por exemplo, a Congregação Cristã no Brasil e a Igreja Universal do Reino de Deus para perceber que uma não tem nada a ver com a outra. Mas mesmo as igrejas históricas, chamadas de tradicionais, também são fruto da descida do Espírito Santo sobre o povo de Deus e, portanto, vivem o Pentecostes. 

Importante notar que o Pentecostes não foi somente um evento que aconteceu em um dia num passado distante, mas um acontecimento que iniciou naquele dia e continua acontecendo até hoje. Sim, o Pentecostes acontece até hoje. Não quero com isso legitimar algumas práticas que irmãos em Cristo afirmam serem decorrentes da ação do Espírito Divino sobre os crentes. Não me refiro a isso e considero a maioria dessas práticas decorrentes de outros fatores, não da presença da Terceira Pessoa da Trindade em sua vida.  Estou falando dos verdadeiros milagres acontecidos em Jerusalém durante a festa que leva tal nome. 

O mais importante de todos os acontecimentos daquele dia, e do qual todos os outros decorrem, foi a vinda do Espírito Santo sobre os filhos de Deus. Esse fato foi o cumprimento das promessas de Jesus de que seus seguidores não ficariam sós e de que ele estaria conosco até a consumação do século. Essa ação de Deus garante a continuidade da sua presença entre nós, presença que significa cuidado, proteção, ensino e direção. 

Uma primeira consequência da presença do Espírito Santo no meio do povo do Senhor foi que os discípulos se tornaram ousados para anunciar a salvação de Jesus. Aqueles homens e mulheres que antes estavam escondidos com medo das autoridades judaicas agora saíam a público a anunciar que o Filho de Deus esteve entre eles e traz vida em plenitude. Como o Senhor Jesus afirmara antes, os discípulos receberam poder do Espírito Santo para testemunhar o Evangelho. 

A segunda consequência é que a palavra de Deus, apresentada pelos apóstolos de Jesus é entendida pelo povo através da atuação do Espírito Santo. O milagre relatado no texto, muitas vezes, é relacionado às pessoas compreenderem uma língua diferente. Mas o milagre maior é que os ouvintes compreenderam a mensagem da salvação e esta só pode ser entendida pela ação do Paráclitos, mesmo quando expressa no próprio idioma. A ação do espírito santo gera novos filhos de Deus, produz salvação. 

A terceira consequência da vinda do Espírito sobre o povo de Deus é a comunhão criada entre tantas pessoas de nacionalidades diferentes, culturas heterogêneas, crenças distintas. Essa comunhão existe e só existe pela ação do Divino Espírito. Sem ele, não aconteceria a unidade entre tanta diversidade. 

Assim, o grande milagre acontecido pela ação do Espírito Santo em sua vinda sobre a igreja é a ousadia em proclamar o evangelho, a conversão e salvação das pessoas e a formação do povo de Deus em comunhão nas diferenças. Esse grande milagre continua acontecendo hoje pela ação divina. Por isso, continuamos a viver o Pentecostes, continuamos a viver sob o poder do Espírito Santo.


Domingo, 11 de junho de 2017.

O amor que Deus põe nas pessoas 

É muito repetido em nossas igrejas que na língua grega do período do Novo Testamento havia três palavras para amor: ágape, fileo e eros. Diz-se que o ágape representa o amor espiritual, o mais sublime de todos os sentimentos, já o designado por fileo representa o sentimento de afeição fraternal que une amigos próximos, enquanto o eros é o amor carnal, a atração física natural entre homem e mulher. Nas comunidades cristãs é continuamente repetido a necessidade de desenvolvermos o ágape e o fileo entre os irmãos e demais pessoas com as quais convivemos. Porem, o mesmo cristianismo tem tido outra postura no que tange ao eros. Ele considera puros, incentiva e promove o ágape e o fileo, mas considera sujo, proíbe e pune o eros. 

Por muito tempo se tem colocado a sexualidade como um campo apenas de tentação, pecado e desvio do ser humano dos caminhos de Deus, como se não tivesse sido o Senhor quem criou as pessoas sexuadas. Ainda hoje há quem acredite que o pecado original que causou a queda do ser humano foi uma relação sexual. Tal absurdo não se sustenta biblicamente, pois ao homem e mulher criados, o primeiro mandamento que lhes foi dado foi o de se multiplicarem (Gn 1,28). Se o Senhor lhes deu essa ordem, como poderia considerar a sua união como pecaminosa? 

Além disso, diversos outros textos bíblicos fazem positiva referência ao amor entre um homem e uma mulher. O livro de Cantares é um grande poema de amor entre noivo e sua querida, deixando muito claro o aspecto físico desse relacionamento. Moralistas tentam interpretar esse livro como uma metáfora do relacionamento entre Cristo e a igreja. Só que tal interpretação não se sustenta ao se observar o texto. E, se considerarmos que assim fosse, Deus não usaria uma coisa pecaminosa para representar o relacionamento do seu Filho com seu povo. 

Outra importante referência bíblica para demonstrar a consideração que o Senhor tem por esse tipo de amor é que Jesus realizou o seu primeiro milagre em uma cerimônia de casamento, trazendo novamente a essa festa a alegria do vinho que tinha terminado. 

Alguém poderá contestar essas afirmações dizendo que o eros dá margem a muitas formas de pecado como a sexualidade sem compromisso, a coisificação do corpo e da pessoa, o adultério, a pornografia, a pedofilia, etc. Mas é preciso considerar que todas elas são distorções da sexualidade saudável e que elas não constroem relacionamentos saudáveis e nem são fruto de verdadeiro amor. Além disso, as distorções do ágape e do fileo também são manifestações de pecado e igualmente geram morte. 

Deus concede ao ser humano uma variedade de possibilidades que ele pode experimentarem sua vida, sem que uma exclua necessariamente a outra. Embora a espiritualidade seja um componente fundamental na vida de um casal, a sexualidade também o é. Uma vida saudável não é aquela que desfruta intensamente de apenas uma vertente, mas que constrói todos os tipos de vivência de forma adequada e equilibrada. 

Os cristãos não podem, em nome de um moralismo que não vem do Senhor, querer limitar ou restringir o que ele nos deu como bênção. Tanto é pecado restringira liberdade quanto liberar a restrição. 

O amor, em todas as suas formas, vem de Deus. E o Senhor o deu às pessoas para que elas construíssem suas vidas de forma prazerosa e saudável. Que o ser humano não considere mal aquilo que Deus fez e viu que era bom.


Domingo, 18 de junho de 2017.

A revelação de Deus 

O verbo revelar significa mostrar algo que está oculto, escondido; desvelar. Era usado na antiga tecnologia de fotografia: usava-se um papel revestido de um preparado fotossensível no qual se registrava a imagem. Quem olhasse para o papel só veria branco. Esse papel era inserido em um líquido revelador e outro fixador. À medida que o revelador ia reagindo com o preparado do papel, a imagem, antes oculta a olhos nus, ia aparecendo. O líquido não imprimia a imagem, ela já estava lá. Mas estava invisível aos olhos humanos e o líquido fazia com que ela fosse vista, ele a revelava. 

O termo revelação, penso eu, foi mais uma palavra que uma outra atividade humana emprestou da religião. Afinal, revelar tem a ver com o ato de Deus de apresentar ao ser humano a sua própria pessoa e a sua vontade. Para isso, o Senhor usa de vários instrumentos conforme for da sua vontade. Ele usa desde a própria criação até o seu Filho Jesus, a perfeita imagem do Deus invisível. 

Um ponto que merece ser destacado é a Bíblia, as Escrituras Sagradas. Chamada por nós de Palavra de Deus, ela é o testemunho escrito da percepção que homens e mulher estiveram da pessoa e do agir de Deus em sua vida e no meio de seu povo. Cremos que tais escritos foram inspirados pelo Espírito Santo se tornando cânon, ou seja, um parâmetro para tudo aquilo que se diz ser revelação de Deus. Sendo as Escrituras Sagradas inspiradas por Deus, e visto que ele não se contradiz, não pode ser revelação aquilo que não esteja de acordo com a Bíblia. 

Como já dissemos acima, nós não podemos determinar as formas que o Senhor usa para se apresentar ao ser humano, mas podemos, com a ajuda das Escrituras Sagradas, perceber o que vem dele e o que não vem. Desde os tempos bíblicos muitos falsos profetas apresentavam mentiras como sendo a palavra do Senhor. Essas mentiras tinham uma característica comum: eram aquilo que as pessoas queriam ouvir. Ao contrário dos profetas verdadeiros que proclamavam a palavra do Senhor, os falsos profetas pregavam o que os reis e outras pessoas gostariam que Deus falasse. E, com isso, ganhavam a simpatia dos poderosos, mas a rejeição de Yahweh. 

Essa mesma estratégia é usada ainda hoje por muitos falsos profetas de nosso tempo. Não se importam com o que a Bíblia ensina, e muito menos com o que é verdade de Deus. Falam aquilo que as pessoas querem ouvir e dizem que foi revelação de Deus. E por revelação tratam desde banalidades até assuntos muito sérios,porém, não trazem a palavra de Deus, mas o que as pessoas querem ouvir e dizem que tais mentiras são profecia ou revelação. 

Foi bastante constrangedor um caso que aconteceu em nossa igreja. Tínhamos um presbítero que era empresário e apoiava tais pregadores. Certo dia alguém levou um desses falsos profetas em sua empresa e este, sem conhecer pessoalmente o presbítero, mas sabendo que ele possuía uma situação financeira boa, começou a lhe “profetizar” palavras de sucesso e prosperidade. O problema é que, em vez de dirigir sua revelação ao dono da firma, o fez a outro irmão, também presbítero, mas que era um funcionário. O irônico é que Deus teria revelado a prosperidade, só que à pessoa errada. 

Muitos outros exemplos desse tipo de falsa revelação poderiam ser dados. Há, certamente, também aqueles que acertam, visto que sua fala é de tal forma geral, que sempre haverá algo que se enquadre nela. É como aqueles adivinhos que afirmam que “se não chover, fará sol”. O que devemos saber, como cristãos, é que esse tipo de palavra é adivinhação, não profecia, e a Bíblia a classifica como abominação ao Senhor. 

Muitas pessoas, mesmo crentes sinceros, são ludibriados por essas pessoas de fala envolvente, simpáticas e sedutoras, que tal qual uma víbora venenosa, hipnotizam suas vítimas antes de as devorar. 

É preciso saber que a revelação de Deus apresenta a sua pessoa, denuncia o pecado e chama à conversão e à salvação. São palavras de amor e paz para os que se arrependem dos seus pecados, mas de dura condenação para aqueles que em seu nome proclamam mentiras. Sejamos sábios e busquemos a legítima palavra de Deus que traz vida e não as mentiras escondidas em falatório bonito.


Domingo, 25 de junho de 2017.

O frio dos dias 

Chega o inverno e com ele cai a temperatura; O vento frio e a chuva fina e constante colaboram para diminuir ainda mais as marcas do termômetro. Nessa época retiramos do fundo das gavetas as malhas, os agasalhos e as meias de lã. Não sei se é só impressão minha, ou consequência da idade que avança, mas me parece que de uns anos para cá os invernos têm sido mais rigorosos. 

Nessa época, a vontade da gente é se enrolar em um cobertor e marcar plantão em frente à televisão, preferencialmente com uma caneca de chocolate quente na mão. Fazemos de tudo para só sair de casa para aquilo que for extremamente necessário. Alguns irmãos chegam ao cúmulo de nem mesmo vir à igreja nos dias mais frios. 

E pensar que, por estarmos em uma cidade que fica no nível do mar e numa região de clima subtropical, nosso inverno é relativamente brando e nem se estende a friagem por muitos dias. Certa vez, conversando sobre o inverno uma moça de Londres,quando lhe contei como eram os dias frios de minha cidade, ela retrucou dizendo que esse era o verão na sua terra. E assim aprendemos que há frio muito mais intenso que o que passamos. E há tipos de frio muito mais intensos do que qualquer intempérie.

Vivemos em um tempo marcado pelo avanço das comunicações. Tecnologias como o rádio, a TV e a internet aproximaram as distâncias de modo que podemos participar ao vivo de um evento que acontece do outro lado do mundo. Se pensarmos que até pouco mais de quinhentos anos a Europa não sabia da existência da América, vemos quanta diferença entre aquela época e agora. As pessoas falam e veem umas às outras estejam onde estiverem. E, no entanto, desconhecemos aquele vizinho que divide a parede conosco. Em meio a tanta comunicação, há pessoas ainda hoje extremamente solitárias: não veem ninguém, não conversam com ninguém, são até mesmo abandonadas. O frio da solidão faz doer muito os corações que se sentem sozinhos,mesmo que cercados pela multidão. 

Gelados são também os corações daqueles que vivem para si mesmos e unicamente para si mesmos, que não buscam nada além da própria satisfação, dos próprios interesses, que não olham para o outro e não veem o irmão que está à sua volta.Se alguém lhes procura em sofrimento, dão de ombros e dizem: “isso não é problema meu”. Aliás, são eficientes em arranjar desculpas para não socorrer ao necessitado, escondendo a sua culpa e insensibilidade. O egoísmo congela o coração de tal modo que essas pessoas nem conseguem enxergar a própria condição. 

Duas situações opostas, uma em que a pessoa é solitária porque foi isolada e esquecida pelos outros, até mesmo pelos que mais amava; outra em que a pessoa se isola de todos os outros, deixando de amar até mesmo aqueles seus mais próximos. Duas situações, mas um só resultado: o coração petrificado. Em ambos os casos fica a dura frieza de coração que congela a alma. 

A esperança está em que, por mais rigoroso que possa ser o inverno, ele tem um fim e depois vem a primavera, ou seja, não há frieza de coração para a qual não exista uma saída, uma solução. Deus chama o seu povo a viver em comunhão, o que significa compartilhar a vida, dividir as dores e alegrias, as cargas e as forças. É amparar e ser amparado, ajudar e ser ajudado. Essa comunhão derruba as barreiras do isolamento que torna as pessoas solitárias, seja por sua escolha ou não. Para vencer o frio da solidão e do egoísmo, o Senhor convida para o calor da comunhão do seu povo.


Domingo, 02 de julho de 2017.

Pecado e culpa 

Lembro-me que em meus tempos de adolescente, nos acampamentos que frequentávamos, havia os famosos sermões evangelísticos que encerravam com o apelativo apelo para que os jovens presentes fossem à frente “aceitando a Cristo”. E muitos iam. O primeiro fato a observar e lamentar é o uso dessa expressão, que apesar de bastante usada em nosso meio protestante, não tem base bíblica. O segundo fato,e para o qual quero chamar a atenção agora é para o ato em si: mais do que qualquer manifestação da presença do Espírito de Deus convertendo os jovens ali presentes, essa resposta era consequência de um ambiente de constrangimento bem preparado: primeiro se colocava uma grande carga de pecado e culpa (e qualquer psicólogo formado no botequim da esquina sabe como é fácil fazer um adolescente se sentir culpado), afirmava-se o cruel destino de perdição para posteriormente oferecer a salvação a quem se levantasse e fosse à frente. 

A princípio, tal pregação, embora arminiana não continha nenhum erro doutrinário grave, além daqueles típicos dessa corrente doutrinária. O problema era outro. 

O problema dessa é enfatizar mais o pecado e a culpa do que a graça. Além disso, transforma o pecado em uma série de atos que podem ser listados e facilmente identificados. Nós, evangélicos, ainda colocamos um peso muito grande em pecados ligados a questões determinadas: sexo, bebida, fumo. Assim, é pecado o sexo fora do casamento, a embriaguez e outras coisas desse tipo. E, às vezes, fechamos os olhos a questões muito sérias como o preconceito, a discriminação, o egoísmo, a avareza, a indiferença à dor do outro, etc. 

Um efeito colateral de uma lista de transgressões é pensar que, quem não pratica nada que esteja na relação não é pecador ou culpado. Por exemplo, se não fomos eu e minha esposa que geramos as crianças que estão nas ruas sujeitas a todo o tipo de violência, não me acho responsável por elas. Ou, se não desmato uma área da Amazônia, não me vejo como culpado da crise ecológica. E, não sendo responsável, não me envolvo nessas questões. 

Outro efeito colateral desse rol de iniquidades é que quem não as pratica se acha no direito de tecer críticas, às vezes pesadas e quase sempre destrutivas, sobre quem caiu em um desses erros. Posta-se como guardião da fé, da moral e dos bons costumes quando é tão pecador quanto o outro. Talvez apenas os pecados sejam diferentes.  

A natureza pecaminosa, que não foi criada no ser humano, mas que se incorporou a nós quando do pecado original, é a mais terrível realidade da nossa existência. Ela nos separa de Deus e frutifica nas pessoas na forma de pensamentos, ações e omissões que degradam a dignidade humana. Pecado é tudo o que diminui a dignidade com que o Criador dotou homens e mulheres no princípio da história. 

A solução de Deus para o pecado não foi nem a indiferença omissa nem o moralismo. Ambos foram rejeitados por Jesus. A solução de Jesus foi a cruz, sinal da graça maravilhosa e do perdão pelo lado divino e do arrependimento e da conversão pelo lado humano. A conversão e o arrependimento são condições indispensáveis para a salvação. Ela não acontece por medo, constrangimento ou iniciativa humanos, mas pela ação do Espírito Santo que convence do pecado, leva ao arrependimento e conduz à conversão. Jesus não pregou para causar constrangimento, sentimento de culpa ou humilhação, mas para conduzir as pessoas à conversão e à nova vida.


Domingo, 09 de julho de 2017.

Como o mundo está mudado! 

Resgatar fotografias antigas é um exercício de paciência consigo mesmo. Rever as próprias imagens com os cabelos e roupas que usávamos na adolescência dos anos 70 sem morrer de vergonha e riso ao mesmo tempo é impossível. Mas há outras situações que essas mesmas fotos nos fazem lembrar. Por exemplo, nas imagens capturadas na igreja estão todos – ou quase todos – os homens de paletó e gravata e as mulheres de vestidos bem comportados. 

E isso não faz tanto tempo assim! Quando comecei a frequentar reuniões do presbitério, íamos todos de terno: calça, colete e paletó – e a indispensável gravata. Hoje os costumes parecem mudados. Há quem vá às reuniões do concílio regional de bermuda, camiseta e boné com a aba para trás, fazendo tipo badboy e se achando, como dizem. 

Se as mudanças se limitassem aos trajes ou aos cortes de cabelo, estaria tudo bem. O problema é que elas têm um alcance muito maior e mais profundo atingindo áreas da vida muito mais importantes na formação da igreja e da sociedade. A começar da formação familiar. Em tempos passados as pessoas prometiam o “até que a morte nos separe” com a intenção  e afirme convicção de  que iriam juntas até os seus últimos dias. Filhos respeitavam mais os seus pais e a família vivia mais próxima. Brincávamos nas ruas sem grandes preocupações com segurança. Tudo era diferente. 

Diferente, mas nem sempre melhor. A começar pela TV que era em preto-e-branco. E havia situações significativamente piores. Os pais viviam com medo que seus filhos pegassem sarampo, varíola ou a terrível paralisia infantil, nome popular para a poliomielite. As pessoas com sessenta anos eram consideradas idosas e, se alguém, muito raramente, chegasse aos oitenta era considerado muito, muito velho. 

Não havia tanta droga e nem violência, é verdade, mas houve duas grandes guerras e os horrores que elas causaram não eram menores que os de hoje. Além disso, se hoje vivemos sob medo de uns loucos, na época da guerra fria os loucos de então quase nos jogaram bombas atômicas na cabeça algumas vezes. E a imprensa não era livre para noticiar a corrupção da época, por isso pensamos que ela não existia. 

De tudo que aqui está posto, temos que concluir que o mundo está mudado. Não penso que esteja nem melhor e nem pior, está diferente. Se melhorou em alguns aspectos, piorou em outros e se deteriorou algumas de suas estruturas, incrementou outras. Certamente que as pessoas que cresceram sob determinadas condições têm mais dificuldade de se adaptarem às exigências deste tempo. Sinto pena de ver algumas pessoas de idade, humildes, tentando sacar dinheiro num caixa eletrônico.Tal desconforto atingirá também as crianças de hoje que se sentirão ultrapassadas daqui a algumas décadas, porque o mundo está sempre mudando. 

O mundo está sempre em mutação e nós precisamos nos adaptar a ele, queiramos ou não. Mais que isso,cada geração é chamada por Deus a responder aos desafios de seu tempo. Não basta conhecer tudo que os pais ensinaram e viveram, pois isso é passado. O passado explica o que somos hoje, mas não define o futuro. O que define o que seremos amanhã é como nos portamos hoje. E o tempo de Deus é o hoje, nem o ontem e nem o amanhã. Como cristãos somos enviados hoje pelo Senhor Jesus ao mundo atual para responder com o Evangelho aos seus desafios. 


Domingo, 16 de julho de 2017.

A palha e o tijolo 

Uma das grandes diferenças da igreja de décadas atrás e da de hoje é refere-se ao envolvimento e participação das pessoas nas atividades eclesiásticas. Tenho uma amiga, presbítera, da mesma faixa etária que eu e a quem conheço desde os nossos tempos de mocidade que diz que a nossa geração é a última na qual os crentes vão à igreja aos domingos pela manhã e à noite. A tendência é que as pessoas frequentem os cultos pela manhã ou à noite. Há até mesmo igrejas em nossa denominação que concentraram seus trabalhos dominicais em um só período do domingo. 

Mas a participação em tempos passados não se restringia aos fins-de-semana. O culto no meio de semana, as reuniões de oração nos lares e mesmo outras atividades em muito mais concorridas. Houve tempo em que as senhoras da igreja se reuniam semanalmente em oficina de costura a fim de preparar roupas para pobres e entidades carentes. Os filhos de crentes desde cedo estudavam música e aprendiam a tocar um instrumento musical. E ninguém tinha preguiça de levantar cedo no domingo, visto que todos dormiam o suficiente todos os dias. 

Essas transformações não aconteceram somente na igreja. Na verdade, nessa área, ela reflete a sociedade. Décadas atrás a vida era muito mais simples e a família vivia muito mais próxima. Era comum que pais e filhos fizessem todas as refeições juntos e tinham muito mais tempo para passarem unidos, até mesmo para o lazer. A família era muito mais agregada.

A vida era mais simples porque as exigências eram menores. Poucas pessoas faziam um curso universitário, até porque existiam poucas faculdades e estas estavam concentradas em um número reduzido de cidades. Hoje se exige de quase todo o profissional não só o chamado curso superior como a constante atualização em pós-graduações e participação em congressos, feiras, etc. Pede-se a qualquer profissional que tenha um diferencial, o domínio de línguas estrangeiras, programas de computador, especialização em alguma área de atuação profissional,etc. 

Até mesmo os momentos de lazer ou dedicados a tarefas antes particulares – como expressão artística, trabalho voluntário ou cultivo da fé – são enquadrados em rígidas regras sociais. 

Assim, em lugar de se dedicarem à família e outras atividades que lhes dê prazer ou lhes convide ao pensamento e à reflexão crítica – como a arte e a religião – as pessoas são enquadradas em um rígido calendário de atividades, se elas quiserem ter sucesso em sua carreira profissional. 

Tal situação me faz lembrar dos israelitas no Egito, quando o Faraó achou que eles tinham tempo demais para pensar em bobagens como se libertar do jugo da servidão. Ele mandou que os descendentes de Jacó continuassem a fazer os tijolos, mas agora não lhes seria fornecida mais palha, eles que a preparassem. Assim ocupariam seu tempo com trabalho escravo digno e não pensariam bobagens. 

Hoje, o faraó chamado sistema exige de cada um de nós uma dedicação que leva ao sacrifício da família e da vida pessoal. E quem tenta resistir a esse soberano é massacrado pela exclusão e pelo fracasso. Quem não se rende a ele ou não encontra espaço no sistema econômico ou é desprezado como aquele que não conquista os fetiches do mercado. Como o povo de Deus no passado, não podemos nos render a esse faraó, sob o risco de sermos massacrados pelo sistema. É preciso encontrar as brechas no sistema e resistir a ele. O bem-estar de nossa família, nossa comunhão com Deus, e nossa própria felicidade não podem ser negociadas em benefício da produção de bens e de riquezas. 

Também não significa que vamos estagnar num modo de visa ultrapassado e não nos engajarmos na evolução do ser humano e de sua sociedade. Só que evoluir nem sempre significa seguir a corrente estabelecida. Pelo menos, não em todas as suas vertentes. 

Tal como os israelitas do passado, precisamos clamar ao Senhor para que nos liberte desse poder que sacrifica a vida das pessoas em nome de sua grandiosidade. Que o Senhor, à semelhança do passado, também ouça o nosso clamor e nos livre desse tipo de servidão. 


Domingo, 23 de julho de 2017.

Quem te faz feliz 

A felicidade é uma condição buscada, penso eu, por todos os seres humanos. Quem não quer ser feliz? Acho que todas as pessoas. Mas a felicidade não é sempre fácil de ser alcançada. Ela tem seu preço e nem todos estão dispostos a pagar essa conta. Para ser feliz é preciso se empenhar a fim de concretizar os próprios sonhos e esse empenho exige abnegação, renúncia a outros prazeres, trabalho e muitas outras coisas.

Por isso, muitas pessoas entregam a outro a responsabilidade pela sua felicidade ou infelicidade. Um exemplo dessa postura era a crença nas tais maldições hereditárias, segundo a qual a pessoa sofria desatinos não por culpa sua, mas de um antepassado que houvesse feito. Ou ainda pessoas que entregam a Deus, não como ato de fé e submissão, mas de omissão para consigo mesmas. 

Há pessoas que procuram conselheiros, terapeutas ou psicólogos para lhe dizerem oque fazer diante das circunstâncias da sua vida, transferindo para eles a responsabilidade de suas decisões e, consequentemente, também da sua felicidade. Ao se comportarem exatamente como lhe disseram para fazer, essa pessoa não terá culpa nenhuma se os conselhos derem errado, afinal ela fez apenas aquilo que lhe foi mandado. Nem o Diabo é culpado pela infelicidade de ninguém, nem Deus é responsável pela felicidade de alguém. Se eles não são, muito menos outro ser humano o será. A realização de uma pessoa não é encargo de outro, seja ele esposo ou esposa, filho ou pai, amigo, patrão ou empregado, ou quem mais for. 

O responsável por fazer um ser humano feliz é a própria pessoa! Não se pode transferir essa carga para ninguém. Cabe a cada um escolher entre a vida e a morte, a alegria e a tristeza, o caminho certo ou o errado. O Senhor nos ensina o caminho para a felicidade, enquanto o mundo apresenta atalhos que indicam levar à realização, mas seu fim é a destruição. Cabe a cada um escolher a instrução do Senhor ou as ilusões do mundo e assumir as consequências da sua escolha. Essa é uma tarefa quem ninguém pode transferir a outro. 

O caminho que o Senhor Jesus nos mostra para a felicidade é completamente diferente do que o que o mundo oferece. As diversas vertentes do que o mundo chama de sabedoria afirmam que a realização do ser humano se dá pela satisfação de algum dos seus desejos ou necessidades, seja o prazer ou a virtude, alegria sempre centrada na própria pessoa. Para o mundo o contentamento se encontra em alguma forma de exaltação de si mesmo. 

Jesus nos apresentou um caminho totalmente diferente, oposto até. O Mestre nos ensinou que quem quiser ganhar a sua vida vai perde-la, e quem perder a sua vida por amor a ele vai ganha-la. A alternativa que Jesus propõe parece um paradoxo, mas é exatamente isso: a felicidade não está em realizar os próprios desejos e necessidades, mas em, por amor, atender ao outro em suas carências e expectativas. Não é viver em soberba, mas em serviço; não é ajuntar tesouros para si, mas dividir o pão com o próximo. 

O Senhor mostra o caminho para a felicidade. Não é o caminho largo e fácil que o mundo apresenta. Ao contrário, é estreito e exigente. Mas é o caminho que conduz à realização pessoal, pois o sentido da vida é servir. Ele não decide por nós e nem assume a responsabilidade pela nossa alegria, mas ensina a forma de alcança-la. É tarefa de cada um construir ou não a sua própria felicidade. 


Domingo, 30 de julho de 2017.

114 anos da igreja brasileira 

Amanhã a Igreja Presbiteriana Independente do Brasil comemora 114 anos de existência.Embora tenha sido organizada no dia 1º. de agosto de 1903, celebra-se o seu aniversário no dia 31 de julho. A sua separação da igreja então ligada às instituições eclesiásticas da América do Norte foi um ato de coragem e de compromisso com o Evangelho e com a realidade de nosso país. 

Muito se fala da questão maçônica, mas ela nunca foi a questão central na formação da IPIB. O mais importante, sem dúvida, foi a ideia de se ter uma igreja brasileira, inserida na cultura e voltada para a realidade do nosso país, seus valores e seus problemas. 

O ato de coragem a que nos referimos acima teve as suas consequências, boas e más.Afinal, nenhuma tomada de posição dessa magnitude fica imune ao que dela decorre. 

O rompimento com a igreja americana trouxe, por um lado, a capacidade de gerir sua própria vida, escolher suas prioridades, estabelecer seus objetivos segundo sua experiência. Por outro lado, trouxe certo isolamento, especialmente em questões internacionais, atitude que só piorou com o passar do tempo. Esse sectarismo, em muitos momentos, se radicalizou até o ponto de se tornar um triunfalismo, um pensar que somos A igreja, a melhor, a certa, quase que a única que procura seguir a verdade de Deus e andar nos caminhos do Senhor. 

Se, por um lado, conquistamos a independência de escolher nossos caminhos teológicos, nossas prioridades missionárias, nossa forma litúrgica e nosso modelo administrativo, por outro lado sofremos com a falta de recursos financeiros e humanos que limitaram nossa ação em território nacional. Outras igrejas que a cem anos eram do mesmo tamanho que a nossa e hoje são bem maiores, cresceram porque contaram com o fundamental apoio externo. E não somente financeiro, mas também humano.  

Essa situação, contudo, não deve ser encarada somente pelo aspecto negativo. Nos deu experiência de conviver e fazer o trabalho missionário ainda que com recursos escassos. Tempos atrás, conversando com um professor estrangeiro que lecionou em um seminário daqui por anos, perguntou como em nossa faculdade lidávamos como corte das verbas externas que estavam causando sérios problemas na instituição que ele lecionara. Para nós, esse corte nunca afetou porque sempre caminhamos com nossas próprias pernas. 

A tomada de posição teve também aspectos altamente positivos.  Nossa igreja teve a oportunidade de seguir em frente e assumir posturas ousadas e positivas. As mulheres de nossa comunidade não são impedidas de participar de todos os ministérios e esferas de decisão; as crianças não são excluídas da comunhão dos santos e incorporamos a musicalidade da cultura brasileira em nossas celebrações. 

Mas ainda há muito o que caminhar. Principalmente no que se refere à identidade da nossa denominação. Infelizmente existem em nossa igreja, oficiais e até mesmo pastores que pouco se importam com o pensamento e os valores reformados, afirmando demagogicamente que isso é mera tradição humana. E fato, é tradição, é uma rica herança que recebemos de nossos pais espirituais nos trouxeram de suas experiências no Evangelho de Jesus. Jogar fora essa herança é esquecer não os caminhos de João Calvino ou Lutero, mas de Jesus. O sofisma de tais líderes só dá margem a que preguem o seu próprio evangelho e não o de Jesus Cristo. 

Há também uma grande contribuição moral e espiritual que nossa herança reformada pode dar à sociedade brasileira. Especialmente nesse tempo em que o nome evangélico é associado a questões de baixa estatura ética, a tradição presbiteriana de integridade, educação e serviço tem muito a oferecer como rota alternativa para nosso povo. 

Ao comemorar os 114 anos da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil podemos nos alegrar com a história que nos foi passada sem, contudo, cair no triunfalismo que cega os olhos críticos. E, dando continuidade nessa tradição, seguir nos passos de Jesus em direção ao testemunho do verdadeiro evangelho em terra brasileira


 Domingo, 06 de agosto de 2017. 

Pelo quê você quer ser conhecido 

Num desses dias, eu estava na Rodoviária de Santos, esperando meu ônibus para São Paulo, quando fui abordado por uma senhora que me perguntou se eu era o pastor da Igreja Presbiteriana. Era a Sra Violeta, que esteve em algumas reuniões na casa da Sra Maria do Rosário. Durante a conversa, ela disse e repetiu que me reconheceu porque eu estava com uma garrafinha de Coca-Cola zero na mão. Achei estranho aquele tipo de identificação, mas não posso negar que esse é um elemento que de vez em quando o tenho em meu poder. 

Essa situação provocou uma pergunta em minha mente: pelo quê queremos ser reconhecidos? No mundo moderno vivemos em uma grande contradição: se por um lado as multidões escondem o rosto das pessoas, inspirando-lhe um sentimento de anonimato, por outro lado, somos observados a todo o momento, seja pelas indiscretas câmeras que nos fotografam um segundo após o sinal fechar ou ainda por milhares de pessoas que estão à nossa volta. 

O fato é que, de uma maneira ou de outra seremos reconhecidos e julgados pelas pessoas e pela história. O que nos leva a pensar como queremos que os outros nos considerem, se nos admirem, ou sejam indiferentes ou ainda nos condenem. Por certo que ninguém deseja passar à história como uma figura perversa, mas não basta somente querer ter boa fama. Acredito que Hitler desejava ser reconhecido como um grande estadista e não como um facínora. Mas as suas escolhas o conduziram a construir a imagem que construiu. 

Muitos fatores, alguns dos quais até alheios à nossa vontade, hão de interferir no juízo que for feito a nosso respeito. Mas serão as nossas atitudes que determinarão como as pessoas hão de nos ver. 

Como cristãos, a nossa responsabilidade a esse respeito é ainda maior, pois que através de nós as pessoas estarão também observando a presença de Cristo em nós e no mundo. Cabe, então, perguntar, o que as pessoas veem em nós que elas podem reconhecer como cristão? O que elas veem de Cristo em nós? 

Para alguns crentes, a marca pela qual as pessoas nos reconhecem como seguidores de Jesus são as roupas com que nos vestimos ou o corte do nosso cabelo. Para outros, a presença de Cristo se marca pela prática de ações que fogem à razão humana e que são consideradas dons do Espírito Santos. Há outros que imaginam que o ser cristão implica em uma correção moral e um rigor ético irretocável. Todas essas características podem ser até positivas, mas não são elas que caracterizam um verdadeiro cristão. 

O Senhor Jesus disse claramente: Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns aos outros. (Jo 13,35). O amor é a marca distintiva do cristão e a qualidade pela qual ele é reconhecido. Aquele que vive em amor pelo próximo as outras qualidades cristãs o acompanham naturalmente. Já quem não tem amor, pode até ter as outras condições, mas não será verdadeiramente cristão. 

O amor não é um sentimento de simpatia ou de prazer pela presença da pessoa querida, mas é uma entrega em favor de todos os que necessitam, até mesmo por aqueles por quem não se tem afinidade. Amor que não baseado em sentir-se bem ou em ser agradado pelo outro, mas no amor de Jesus que, excedendo a qualquer entendimento, entregou sua vida até por aqueles que o odiavam. O amor do cristão não vem do coração, vem de Cristo. E, por vir de Cristo é que se torna a qualidade pela qual se conhece o cristão.